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Evangélicos & Política


Mais da metade da Câmara Municipal em Nova Friburgo é composta por vereadores que se declaram evangélicos. A proporção, apesar de alta, não é exclusiva do município. Cresce o número de representantes evangélicos nas diversas esferas de poder no país. A prefeitura do Rio tornou-se o símbolo maior desse processo.

Sobre isso, há quem se preocupe com uma "tomada do poder"; outros sequer se atentaram para os novos paradigmas que estão se construindo no país. O fato é que há elementos positivos e negativos nesse emaranhado todo.

Alguns pontos me chamam à atenção:

1. Os evangélicos não são um bloco. Não há unidade orgânica entre as muitas denominações de igrejas. Entre o crente batista tradicional, por exemplo, e o frequentador eventual da igreja universal há uma profunda diferença teológica.

2. Da mesma forma, os grupos políticos alinhados às lideranças evangélicas são, igualmente, plurais e, em muitos sentidos, disputam espaços. Há muito conflito e adversidade. Macedo e Malafaia, a título de ilustração, vivem em rota de colisão (salvo quando o adversário é alguém que divirja frontalmente da agenda desses grupos).

3. Os projetos políticos desses grupos não são, necessariamente, a representação de projetos expressos de relação entre igreja e sociedade. Em outras palavras, o espaço (de poder) político conquistado tem mais a ver com a afinidade cultural e ideológica desses grupos com a massa da população brasileira do que com políticas públicas destinadas à transformação da sociedade.

4. A sociedade brasileira vive um profundo conservadorismo ideológico. Há um recrudescimento do tradicionalismo político. Posicionamento que tem se radicalizado muito - esbarrando no reacionarismo - em função da recente experiência com governos de corte mais popular. A rejeição aos partidos de esquerda afeta, infelizmente, as pautas sociais fundamentais para o avanço na qualidade de vida.

5. As igrejas evangélicas (que sempre se posicionaram numa relação "igreja contra cultura", em função da relação conflituosa entre catolicismo e protestantismo desde o fim do século XIX) têm adquirido espaço e prestígio social justamente por conta de seu posicionamento ideológico mais conservador. Têm aprendido a dialogar com sociedade na medida em que aprenderam a reproduzir o conservadorismo social e ser, em alguma escala, porta voz desses posicionamentos. Os grupos evangélicos, via de regra, estão na contramão da agenda de garantia de direitos na contemporaneidade.

6. Além do crente tradicional (de roupa longa e Bíblia embaixo do braço), o político evangélico consegue realizar bem os valores do visitante eventual dos templos neopentecostais; o cidadão que vê a vida pela perspectiva da "família e dos bons costumes". Aliás, esses mantras escondem problemas sérios no tocante aos direitos humanos. Há em curso uma clara regressão e, não raro, violação de direitos na sociedade brasileira. A questão, por exemplo, da redução da maioridade penal e a ojeriza que programas sociais como o bolsa família encontram é sinal de que não há muita relação, na mentalidade evangélica, entre política e solidariedade.

Minha intuição é que o crescimento dos evangélicos na política se deva não exatamente a mérito da igreja evangélica em si, mas de sua conformação aos valores que têm dominado a agenda nacional, especialmente o conservadorismo.

De outro lado, todavia, essa relação só existe porque as igrejas evangélicas têm valores importantes, se pensados sob a ótica de quem vive as agruras de uma sociedade tão desigual quanto a brasileira.

1. O discurso evangélico é empoderador. O indivíduo que ouve sermões entusiasmados e canta louvores "proféticos" é incentivado a "vencer na vida". O mantra do "empreendedorismo" está sempre presente.

2. O discurso evangélico é estimulador de iniciativa pessoal. Há uma dose razoável de autoajuda. O grande gestor da sua vida é você mesmo (sob as bênçãos de Deus, é claro). É a máxima estampada no "pare de sofrer".

O desafio que se coloca é romper com a lógica do "nós contra eles". O que menos se precisa nesse momento no país é de mais esse fosso.

Além disso, tornar o discurso evangélico menos antipático às políticas públicas garantidores de direitos sociais. E, por óbvio, uma prática que seja animadora de mais ética na sociedade.

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