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Sobre o SIM e o NÃO


A Câmara dos deputados admitiu o pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Agora, o processo segue para o Senado onde efetivamente ocorrerá a decisão sob a presidência do Supremo.

A sessão extraordinária agendada para tarde de um domingo não foi uma vontade súbita de trabalhar e desobstruir a pauta, simplesmente; foi a oportunidade de garantir dez segundos de fama global para deputados que, via de regra, só são conhecidos em seus redutos (quando são).

Foi um espetáculo. Bom porque rimos das bobagens ditas sem qualquer constrangimento; bom porque tivemos a singular oportunidade de conhecer nossos deputados. Ruim porque, ao ver a cara – nua e crua – do parlamento, o descobrimos tosco, violento, despreparado, oportunista e debochado; ruim porque sequer tocaram no ponto central do pedido de impeachment (as “pedaladas fiscais”), antes preferiram gritar destemperadamente “tchau, querida”.

Muito ruim porque houve até elogio a torturadores desumanos do período ditatorial recente de nossa história. Houve quem dedicasse seu voto ao seu torturador da presidenta (quando militante pela democracia no país). Um verdadeiro show de horror. Um crime.

***

Estava claro que o SIM venceria. Era o lado mais fácil. Era a opção mais vantajosa.

Votou SIM quem optou pela facilidade. Quem não quis se comprometer. Quem optou por fazer “bonito” aos olhos da “opinião pública”. Teve até quem justificasse seu voto como se fosse votar “não” e terminava, como músico fora do tom, gritando um “sim”.

Votou SIM quem receia avanços nas investigações de corrupção e tem contas a acertar. Quem sabe que a presença da presidenta é um risco.

Votou SIM quem já se prepara para o “novo” governo. Quem já desembarcou do atual porque sabe das boquinhas que terá no próximo. Uma turma de oportunistas. Gente que acumulou forças ao longo dos últimos anos (devido às alianças equivocadas do PT) e agora quer colocar em pauta projetos para diminuir direitos de trabalhadores. Um ponte para o passado.

Sim, acredito que tenha havido votos SIM de quem realmente enxergou crime de responsabilidade; foram minoria. Por eles, o impeachment seria arquivado.

Ah, sim. Haverá os que dirão que votaram SIM para a presidenta e depois vão dizer SIM igualmente ao impeachment de Temer, de Cunha e de Renan. Isso não é verdade. Essa é mesma gente que xinga a presidenta num estádio lotado de “puta”, “vaca”, “piranha” e a manda “tomar no ...”. Essa é a mesma gente que sugere que Dilma faça como Getúlio. Essa é a turma que acha uma cusparada o fim do mundo (concordo que seja um destempero e uma falta de educação), mas não consegue enxergar a gravidade do que significa homenagear Brilhante Ustra. Isso se chama fascismo.

***

Estava igualmente claro que o NÃO não prosperaria. Era a tarefa árdua. Era a certeza de uma derrota em rede nacional.

Votou NÃO quem tem a obrigação moral de defender o governo. Os membros do partido, por exemplo. Mesmo que, na hipótese de se configurar o crime, precisaria fazer o coro dos defensores do governo. São os situacionistas (custe o que isso custar).

Votou NÃO, por outro lado, quem - apesar de ser oposição e considerar turvo e indefensável esse governo ineficiente - sabe que não houve crime (não houve dolo e responsabilidade) e sabe que o que está em tela é, sim, um golpe. Afinal, impeachment sem crime é golpe.

Votou NÃO quem sabe que o que está em jogo é outra questão. Gente que quer o poder mas sabe que não o alcançará pelas urnas. Gente que só chegou ao poder enviesadamente (como com Sarney, Itamar e, agora, com Temer).

Votou NÃO quem escolheu a coerência à conveniência.

***

Estão por aí dizendo que quem votou NÃO desagradou e vai pagar caro por isso nas urnas. Sinceramente, não creio. É claro que haverá desgastes: ninguém passa incólume por um processo desses. É óbvio, por outro lado, que haverá novas adesões: gente que não se via representada naquele picadeiro e enxergou lampejos de consciência.

O tempo dirá. Seja nas urnas (nas próximas eleições), seja no julgamento da História. De uma coisa, eu tenho convicção: quando a História olhar para trás e toda essa confusão das redes sociais tiver se dissipado, restará claro: o Brasil elegeu um operário e, em seguida, uma mulher militante torturada; e a classe política golpeou a democracia para tirá-la do poder. Uns, a isso disseram SIM; outros, contra a correnteza, disseram NÃO.

Eu diria NÃO.

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