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Política e Religião


Há dois equívocos sérios no que diz respeito à relação entre política e religião.

O primeiro tem a ver com aquele que faz do discurso religioso uma espécie de marketing eleitoral; ou seja, utiliza-se do imaginário místico e religioso para lançar candidaturas e construir lideranças messiânicas. Tem a ver com a instrumentalização do espírito r​eligioso em favor de causas estritamente partidárias.

É o que ocorre, por exemplo, com parcelas significativas das igrejas evangélicas no Brasil e seus bispos e pastores candidatos: em razão de suas doutrinas e costumes muito conservadores, acabam por servir de base (e se retroalimentam também) para candidaturas também muito conservadoras, algumas reacionárias mesmo. Partem da ideia de uma salvação do mundo que exige mais mudança de costumes, menos de princípios. Algo que esbarra no messianismo. E no oportunismo também.

De outro lado, há o equívoco dos que pretendem neutralizar a religião como se nada tivesse a ver com política. Partem do princípio de que a religião cuida de questões estritamente espirituais e divinas, enquanto a política das questões materiais e humanas (como se fosse possível existir uma distinção entre esses supostos dois mundos pretensamente opostos e antagônicos entre si). Se bem que esse tipo de discurso, em geral, serve também pra fortalecer aquele primeiro.

Um bom jeito atualmente de ser partidário é dizendo que não é político. Vale lembrar que o novo testamento cristão, para ficar no exemplo da religião dominante no país, faz referência a um ‘reino’ de Deus; ou seja, a presença de Deus no mundo, na fé cristã, se dá efetivamente através de uma existência política, por meio de um reinado. Do contrário, outro termo (que não reino) seria utilizado.

Além disso, vale resgatar o significado originário da ‘cruz’ que (antes de se tornar estritamente um símbolo religioso e quase inofensivo, diga-se de passagem) era um instrumento da estrutura jurídica e penal do Império Romano como ferramenta de tortura e morte para os condenados. Jesus foi morto numa cruz exatamente por ter pregado um reino. E o fez pela via política, sim. Não o fosse, não seriam Caifás e Pilatos seus algozes. Dessa forma, na tradição cristã (e o mesmo vale para as muitas famílias religiosas que há) política e religião são coirmãs.

Toda espiritualidade que se reconhece como instrumento de transformação profunda da pessoa (conversão) e da sociedade (revolução) é necessariamente uma espiritualidade política.

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(*) Ricardo Lengruber é professor. Doutor pela PUC Rio, tem livros e artigos publicados nas áreas de Educação, Religião e Políticas Públicas. Foi Secretário de Educação em Nova Friburgo, presidente da ABIB e é membro da Academia Friburguense de Letras. Visite www.ricardolengruber.com

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