O medo é um sentimento total. Com medo, é difícil perceber a realidade de modo equilibrado. É uma espécie de paralisia. E, em geral, o que se realiza durante os momentos de medo são mais re-ações que ações propriamente ditas. Sentimos medo por causa de alguma ameaça que se nos apresenta. Nesse sentido, o medo é benigno: ajuda a se protejer e, no extremo, a enfrentar. A natureza humana prece ter incorporado o medo como um componente de autodefesa e garantia da integridade. Por isso, como sensação, o medo é passageiro. Ou, pelo menos, deveria ser passageiro.
Os problemas surgem quando o medo se torna permanente e sem uma razão de ser objetiva. Quando o medo deixa de ser reação e passa a ser existencial é uma porta aberta para as mais tristes e anuladoras psicopatias. Tem a ver com depressão, por exemplo. E com tudo de desafiador que exige esse tipo de experiência que, convenhamos, todos estamos sujeitos.
Ou quando o medo se torna instrumento de opressão de uns sobre outros. Quando o medo passa a ser ferramenta de governo, de autoridade, de comando, ou de qualquer outra forma de superioridade que negue ou usurpe o lugar do outro. Quando o medo não é reação. Mas ação de quem quer pisar. Isso ocorre nas relações internacionais. E nos diálogos de quem compartilha o mesmo teto.
Talvez seja por isso que, de tempos em tempos, o “sistema” aposte no medo. Mais que isso: invista. Nada melhor para um sistema de injustiças e desigualdades que uma onda de medo generalizado, que inviabilize a ação criativa dos indivíduos e os estimule apenas a reagir a estímulos cuidadosamente preestabelecidos. Reações que são capazes de eleger presidentes.
O medo é imperial. Seja no seu sentido pessoal e legítimo de quem precisa se proteger de algo e investe todas as suas energias nessa direção. Seja na diabólica estratégia de pisar nos sonhos de quem quer construir um mundo melhor.
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(*) Ricardo Lengruber é professor. Doutor pela PUC Rio, tem livros e artigos publicados nas áreas de Educação, Religião e Políticas Públicas. Foi Secretário de Educação em Nova Friburgo, presidente da ABIB e é membro da Academia Friburguense de Letras. Visite www.ricardolengruber.com