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Prof. Ricardo Lengruber (ricardo@lengruber.com)

Gentileza: aprendendo sobre ser gente


O Profeta Gentileza, que se tornou conhecido por fazer inscrições sob viadutos da zona portuária do Rio, por onde andava com túnica branca e longa barba, tinha na máxima "Gentileza gera gentileza" sua frase mais conhecida e sua meta de vida.

Ele tinha razão: na vida de paredes cinzas, gente correndo e de semblantes cabisbaixos, gentileza pode ser um sopro de vida e de boas energias.

Mas nem sempre é tão simples: num mundo tão machucado pela impaciência e pela intolerância, os gestos de amabilidade nem sempre são respondidos na mesma moeda.

Gentileza, além disso, é também bem mais que apenas “bons modos”.

Às vezes, aliás, por trás de boas maneiras e palavras adocicadas, há interesses escusos e eficientes formas de se levar vantagem.

Mas uma coisa é fato: “a forma” de que se diz é tão importante quanto “aquilo” que se está dizendo.

E isso é bom e ruim ao mesmo tempo.

Bom porque, se a gente souber ajustar o discurso, será possível dialogar sobre os mais diferentes temas, por mais espinhosos e conflituosos que sejam. Boa parte dos conflitos surge por conta da forma ofensiva, debochada ou anuladora do lugar do outro.

Ruim porque, sabendo-se usar bem as palavras e as ideias, pode-se vender gato por lebre facilmente. Uma razoável parcela de “verdades” que se alardeia por aí tem a ver com as imagens bonitinhas e um bom jogo de palavras.

A título de exemplo, vale refletir sobre um vídeo a respeito de “meritocracia” que está circulando bastante nas redes sociais.

Uma fileira de jovens prestes a iniciar uma corrida. O primeiro colocado será premiado. Antes de dar a partida, o organizador vai pedindo que deem um passo à frente os que gozaram de determinados “privilégios”. Depois de meia dúzia de perguntas, uns caminharam bastante, outros permanecem estacionados na linha de partida. O organizador mostra que os que estão a frente assim estão posicionados porque foram privilegiados sem que necessariamente fizessem algo para isso. O mesmo ocorre com os retardatários: nada fizeram por si mesmos que os desqualificasse. Foram oportunidades desiguais apenas.

O vídeo é uma bela demonstração de como um discurso bem feito, coerente, sincero e que humaniza as questões pode conscientizar, convencer e debelar preconceitos.

Vi muitos amigos que, em outros contextos, seriam veementemente contra políticas públicas afirmativas ou de compensação, mas que se sensibilizaram bastante com o vídeo.

Às vezes, falta só isso mesmo: sensibilização.

Gentileza é uma forma de humanização (inclusive, na palavra “gentileza” mora também a ideia de “gente”). Gentil é quem consegue ser gente de verdade.

A questão não é concordar ou discordar. Mas dialogar e aprender conjuntamente.

Falar como quem deseja se colocar – sem necessariamente querer catequisar.

Ouvir como quem apreende com a curiosidade de quem deseja crescer – sem apenas esperar sua oportunidade de falar para apenas contradizer as ideias.

Num tempo de redes sociais pouco sociáveis, de relacionamentos pouco relacionais e de diálogos nada dialógicos uma lufada do olhar atento, da escuta sincera e das mãos disponíveis vale mais que dinheiro.

Quem diria que chegaríamos em pleno século XXI – com tanta tecnologia para nos aproximar – mais distantes do que nunca e tão carentes de um gesto de gentileza.

Gentileza tem a ver com ser gente e encarar quem nos está pelo caminho igualmente como gente.

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