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Educação X Saúde; Autoridade X Doença


As últimas décadas testemunharam mudanças na forma de fazer educação. Primeiro, porque há cada vez mais discussão sobre o papel e a autoridade do professor. Segundo, porque cada vez há mais profissionais de áreas afins interagindo nos processos educacionais.

Não há dúvidas que isso tudo tem seu aspecto positivo. Já se foi o tempo em que a sala de aula era considerada espaço inalienável do professor. Ficou para trás a lógica da coerção como ferramenta pedagógica. Da mesma forma, faz parte do passado a responsabilização exclusiva do professor no que tange ao sucesso ou fracasso de estudantes. Sabe-se, hoje, haver mil e uma questões de ordem social, psicológica, orgânica e física que interferem na carreira escolar.

O que deve ser discutido, porém, é o tipo de limite que tem se imposto à ação dos docentes. Quando se limita a liberdade de atuação de professores, viola-se, paradoxalmente, o direito fundamental que a toda criança deve ser assegurado: a educação. Em nome de garantir direitos aos menores, o mais fundamental deles é relativizado.

Subentendida está a ideia de que educação é mais que instrução; está a convicção que educação passa necessariamente pela conscientização sobre limites e o aprendizado de noções elementares de hierarquia, autoridade e respeito pelo semelhante.

Enfim, está claro que há a necessidade de garantir a integridade das crianças, mas não se pode confundir isso com a limitação do poder de atuação do professor e de sua tarefa de educar.

Deve-se discutir, também, a interferência exagerada de outros profissionais na sala de aula e na vida escolar. Quanto mais se divide a tarefa docente, menos preocupação haverá com a valorização do professor e, o que é pior, mais se colocará em dúvida a competência dos docentes.

Apenas para ficar em um exemplo, tome-se a questão transtornos e déficits de aprendizagem e da hiperatividade. Há uma explosão de diagnósticos a respeito. Psicólogos, fonoaudiólogos e médicos têm ajudado no processo de educar, mas é clara também a confusão entre, por exemplo, dificuldades de aprendizagem e patologias neurológicas; ou, ainda, entre a necessidade de intervenção criativa de métodos didático-pedagógicos e a medicalização da educação.

Sem ignorar que tais quadros existem sim e que devem ser tratados séria e profundamente, não se pode permitir que essa invasão de medicamentos seja a regra. Imagine-se que uma criança submetida aos estímulos da vida contemporânea, especialmente aos de natureza tecnológica, e à rotina cada vez menos organizada das famílias, não pode ser simplesmente taxada de hiperativa na escola e o tratamento da questão ser, diretamente, de natureza medicamentosa.

Às mudanças atuais e naquilo que interferem na vida escolar, deve-se responder, primeiramente, com ações pedagógicas revistas. Quando se recorre imediatamente aos remédios, corre-se o risco de mascarar o problema real e, para além de não os resolver sistemicamente, provocar danos mais graves a longo prazo.

Crianças brincam cada vez menos em contato com a natureza; cada vez menos brincam em grupo e de brincadeiras simples de convivência e respeito pelo outro. Estão cada vez mais expostas a horas ininterruptas de TV e internet; cada vez mais expostas a estímulos que antecipam as capacidades e a maturidade de sua faixa etária. E, infelizmente, a escola, na maioria dos casos, ainda mantém rotinas e metodologias descoladas desse novo tempo.

Se é verdade que a escola não deve simplesmente aderir e aceitar os equívocos dos dias atuais no que tange a crianças, é verdade também que deve se atualizar e se contextualizar de modo a dialogar criticamente com o estado atual das coisas, bem como no auxílio de sua superação.

O que não se pode – sob pena de perda de um valor fundamental das sociedades humanas: a educação – é relativizar a autoridade do professor e tratar as novas demandas da sala de aula como se problema médico fosse.

Está claro é que nossa sociedade tem desafios sérios. Mas é equivocado reduzir (como caso de polícia) a autoridade dos professores ou (com remédios) os chamados transtornos de aprendizagem.

Enfim, talvez a educação, acusada de estar doente, por incrível que pareça, seja, ela mesma, o remédio demandado pela sociedade atual.

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